A expectativa é irmã
chegada da esperança.
A expectativa baseia-se em supostas possibilidades, desenvolvimentos futuros, em pressupostos que apontam em direcções imaginárias. Observamos os seres, as situações, às vezes um pequeno detalhe e…esperamos.
O que esperamos é sempre
fruto do que somos. E do que nos falta.
Possuidora de uma imaginação fértil, fui sempre sensível ao que nos outros me toca e criei, assim, na vida variadíssimas expectativas enquanto achava que estava só a viver o momento e a corresponder-lhe.
Não é assim. Aprendi, contudo,
a controlar as minhas projecções imaginativas quando algo ou alguém me chama a
atenção, quando sinto identidade de alma ou qualquer tipo de sintonia.
A expectativa tem, em
geral, pouca sustentabilidade e, frequentemente, tem mais a ver connosco do que
com o outro. Resulta amiúde de algum
vazio interior, de partes do nosso ser que sentimos incompreendidas ou não
realizadas. O facto de determinada corda em nós se sentir tocada, abre em nós
irracionalmente, uma ogiva para o sol que pode ser ilusória. Em geral, é assim.
Alguém comentou que o desejo é o outro irmão da expectativa.
Alguém comentou que o desejo é o outro irmão da expectativa.
O desejo está intimamente
ligado com aquilo que se espera, por nos faltar. A expectativa, se alimentada
febrilmente (como é muitas vezes o caso), dá origem ao desejo de que algo
específico ocorra. E aí se apresenta a grande armadilha, pois que o desejo é interior
à pessoa, aquilo que ele propõe não faz parte da chamada realidade antes é
resultado de uma carência pessoal, portanto, das fabricações de cada um.
Poder-se-á argumentar que por vezes o desejo
viaja de forma recíproca, ou seja, de quem deseja para o desejado e
vice-versa. Assim é, mas muita dor e decepção se evitariam se, em vez de nos
fixarmos no objecto desejado, a nossa atenção fosse investida de modo estóico
no fluir da própria vida, numa attitude de aceitação e de confiança em que “o
que está escrito nas estrelas” buscará a sua descida à matéria,
independentemente dos nossos desejos pessoais.
Mas, então, que fazer,
quando um timbre mais fino capta a nossa atenção ou a beleza de um gesto, de
uma inteligência, enfim de um canto pessoal, nos causa uma alegria inesperada?
A minha já longa vida
ensinou-me a viver com a tranquilidade possível cada momento, desconstruindo
como posso a inevitável expectativa que sempre se vai formando. As suposições
centradas no futuro carecem em geral de realismo e são o trampolim mais certo
para a decepção. Assentam nas nossas previsões do comportamento dos demais,
muitas vezes das suas características que apenas mal vislumbrámos.
A fim de combater a
sinistra tendência para criar expectativas, sinto que o ser humano tem de
habitar a serenidade e resumir-se à única expectativa legítima: a de si mesmo.
Respeitar o espaço de
manobra do outro, o seu canto e o seu ritmo, sem julgamentos.
Aguardar o timing certo para cada coisa na vida.
Não esperar nada de
ninguém.
Preservar a fluidez da
interioridade para que os mortíferos e sufocantes véus da inquietação e da angústia não
baixem a sua dança de morte em vida.
Não há nada a esperar
fora de nós.
Mas admitamos que, se acaso uma luz afim ilumina, ainda que brevemente, um troço do nosso caminho, a alegria e o consolo são incomensuráveis!
Mas admitamos que, se acaso uma luz afim ilumina, ainda que brevemente, um troço do nosso caminho, a alegria e o consolo são incomensuráveis!
Uma breve mas admirável reflexão sobre um tema deveras pertinente e mais do que nunca tão actual. Gostei imenso desta leitura nocturna. Uma tranquila noite, em despojamento .
ResponderEliminarAbraço
Vi Cardoso Lopes
Muito grata, Vi, pela ressonância que a minha reflexão encontrou em si.
ResponderEliminarTambém para si, uma noite em paz e serenidade.
Um abraço
Mariana
Preservar a fluidez da interioridade para que os mortíferos e sufocantes véus da inquietação e da angústia não baixem a sua dança de morte em vida.
ResponderEliminarEsta é a nossa maior vitória, preservar a fluidez, e a nossa derrota, sermos sufocados pelos nossos próprios véus.
Este foi o parágrafo que me tocou profundamente, pq esta luta interna ao nível de consciência é a nossa maior batalha, travada todo dia, até aprendermos a fluir como uma chama ao sabor do vento.
Estou de acordo, Anna.
EliminarUma aprendizagem muito difícil, sempre com novos aspectos...
Muito obrigado por este comentário profundo que tiveste a gentileza de aqui deixar. É muito importante para quem escreve receber este feedback.
Um abraço, amiga
Mariana