A palavra permite-me escrever
sobre o meu não saber das coisas e da vida, da morte e dos improváveis, dos
sonhos desconhecidos engendrados onde se não sabe, a palavra é a minha barca de
risco, a esperança última de uma depuração que me convem para que me tente
salvar.
Não quero morrer toldada de
ilusões, nem permanecer na memória dos outros como se eu tivesse sido o meu
veículo físico e o meu eu social. Esses terão sido apenas franjas, adornos de
uma circunstância passageira, efémera. Quero que a palavra me escave, me
penetre impediosamente como um aguilhão fomentador de lucidez e coragem e me leve para além do que aparento ser. Nisso
reside a minha talvez única possibilidade de auto-descoberta, aí vive a réstea
de esperança de me confrontar com o que me habita sem que eu saiba. Sem que lhe
conheça os contornos, a origem, o propósito.
Sei que me aguarda o
inimaginável, sei que por entre os
leitos das flores que tanto amo serpenteiam sulcos áridos ressequidos por
vivências da anti-vida. Suspeito que as fórmulas para as abracadabras se hão-de apresentar inesperadamente simples e óbvias,
embora inalcançáveis por agora. Aí me levará a minha barca de risco, talvez
mais longe, quem sabe…
Que ela me faça transitar pelos
demónios da mente e os neutralize! Que dirija os meus impulsos, a descoberta
dos núcleos recônditos aonde o mundo não se atreve a espreitar e lhes revele a
face oculta, ao coroá-los na tangibilidade da palavra. Na palavra que há-de ser
inevitavelmente feroz para abalar o estabelecido, a consciência levantada sobre
si mesma, a falar de uma maior autenticidade e clareza na experiência.
Na união de saber a vida, ao
sentir o que se vai sabendo.
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