-->
Se é
noite, noite é e não quero pensar. À janela da minha torre de marfim espreito a
sinuosa probabilidade de me reinventar assim no breu, apesar da lua alta, do
tom negro-esverdeado de tudo a perder de vista. Sinto uma omnipotência
indecifrável em conexão com algo aqui dentro que não saberei nunca expressar.
Soam
grilos, canta o silêncio inescrutável como um voo invisível, um sonho de que te
não lembras apesar dos esforços. E as fragrâncias da noite, vagas e adocicadas,
viajam entre mim e o infinito escuro para onde me quero projector. A mim ou a
isto aqui dentro que não parece
encontrar porto onde se espraie, horizonte adequado.
Questão
de escalas, talvez, diz-me o poema a querer erguer-se. Das janelas das torres
de marfim isoladas em impossíveis descampados tecem-se, à noite, redes com fios
de luar, estruturas prateadas de apoio a voos secretos que nos levem para além
de nós mesmos. Posso construir uma corola mântrica, fragrante como a noite,
aconchegar os meus sonhos, conhecidos e por conhecer, no coração da flor
espacial e deixar-me ir como um pedaço de brisa, milagrosamente conduzida pelo
equilíbrio das forças e anti-forças universais.
Movimento elíptico ascendente perfumado silencioso invisível. Inexistente.
Continuo à janela da torre de marfim, ancorada numa subjectividade inexpressável, bate bate coração que a noite é longa e nada se revela. Chamam-me da base vozes sem sentido, em ziguezague pelo ar acima, pedaços de tesoura enferrujada, contrárias ao poema que se formava, ao génio na lâmpada de Aladino que já se esfuma…
Movimento elíptico ascendente perfumado silencioso invisível. Inexistente.
Continuo à janela da torre de marfim, ancorada numa subjectividade inexpressável, bate bate coração que a noite é longa e nada se revela. Chamam-me da base vozes sem sentido, em ziguezague pelo ar acima, pedaços de tesoura enferrujada, contrárias ao poema que se formava, ao génio na lâmpada de Aladino que já se esfuma…
Vem, é
tarde, tens de dormir. Amanhã há trabalho.
Nada
mais desliza em mim, abortado o momento glorioso que o não chegou a ser.
Lá fora,
nem os grilos soam agora. Parece-me.
Também o
luar se foi. Parece-me.
Cai
incessante uma chuva miudinha.
Sem som.Quadro: Gertrude Abercrombie, "Torre de Marfim"
Sem comentários:
Enviar um comentário