Morreu hoje a Menina
Mafalda.
Só nos vimos um par de vezes, e em ocasiões
sociais, pois ela era irmã de uma alma muito próxima da minha. Talvez isso nada
tivesse a ver com o facto de eu simpatizar tanto com a Mafalda. Tinha um ar
gaiato, lembro-me que a boca dela me fazia pensar num coelhinho e rodeava-a uma
auréola amigável e carinhosa.
Pois foi, morreu hoje a meio da manhã, uma
enfermeira a seu lado num hospital grande cujo nome me escapa.
Branco, branco e sereno se me apresenta tudo,
quando penso na morte da Menina Mafalda. Chamo-lhe menina pois, conquanto fosse
já sexagenária, transportava em si qualquer coisa meio indizível, talvez da
meninice, de quando se é jovem e se tem curiosidade por tudo.
A serenidade, uma quietude imensa que percepciono
quando penso nela e na sua partida desta dimensão, terão a ver com os méritos
da Menina Mafalda. Já teria cumprido o
seu tempo, o labor e as questões que aqui veio tratar. Nunca foi mãe, mas abriu
as suas asas maternais sobre muitas crianças, ao acarinhá-las a descobrir o
mundo, na primeira infância. Gostava muito delas e elas da Menina Mafalda.
Suspeito que albergasse em si um repositório de amor sem fim a que não
conseguiu dar todo o uso que o seu coração pedia. Também aí se pode ver quão complicada
e tortuosa pode ser a encarnação, os difíceis testes a que vimos nesta breve
residência na Terra.
Sentia-a meiga por dentro, ansiosa por acarinhar e
ser acarinhada, em retorno. Apesar da educação espartana, da moderação
aprendida, irradiava essa luminoisidade cativante.
São assim as coisas. Meio inexplicáveis, à luz do
raciocínio lógico.
Já se foi a Menina Mafalda, como a conhecemos aqui.
Começa agora a ser só memória. Para o marido, os irmãos, para o resto da
família. Para mim, que mal a conheci mas que fui tocada por ela. Até que chegue
a nossa hora e passemos todos a ser também já só memória para os que ainda por
cá continuam.
Nunca acreditamos verdadeiramente nisto, até que
acontece. A princípio, irreal para quem cá fica, depois definitivo e muito
tangível na ausência física daqueles que amamos.
Aplausos para a Menina Mafalda, pelo ser carinhoso,
pelos cuidados com os outros, pelo rastro de paz e serenidade que deixou na
passagem.
Boa viagem para o Esplendor!
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Desenho de LENA GAL
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Desenho de LENA GAL
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