MIM
EM MIM
(ao
encontro das profundezas)
Como
seria se nada disto - deveres, trabalho compras
falta de horas para dormir, gente pesada a arrastar insonscientemente o
peso do mundo nos ombros arqueados sugando alívio à passagem – me entravasse o
passo e eu pudesse movimentar-me solitária e sem interrupções pela costa fina
da noite misteriosa, livre de amarras, ao encontro das vozes que me habitam e
de um inquietante imaginário que, de tanto aguardar, ameaça sublevação?
Não
dá sequer para fantasiar já que me falta o tempo para tal, mas neste momento
clandestino arrancado à punitiva obrigatoriedade dos dias é-me permitido
espraiar-me por segundos na espuma
cintilante de um passageiro alívio e escapar-me para fora da gaiola segura da
vida oficial. Ao teu encontro, sigo, mulher da alma vibrante e dos tenros
núcleos, mulher-criança acocorada por detrás das máscaras da persona, todas
elas necessárias, parece-me, todas tão dispensáveis, talvez. Sinto-a uma alma
antiga, recorrente no esforço de se fazer ouvir, de tornar credível um canto
deslembrado oriundo de um porto inexistente para os detectores tecnológicos. A
fortaleza desconhecida, aplicável sem esforço noutras frequências, sofre aqui
os testes da dualidade, reprime-se, empurrada sem dó para o depósito da reserva
pessoal a utilizar quando sine qua non.
Quando
te entrevejo. Mulher, não te quero mais largar. È como se fora de ti não
existisse mais ar, nem luz ou sentido para a vida. De ti depende a pulsão
saudável do tempo a que alguns chamam a verdade, em ti se prendem todos os meus
encantamentos e a única grande esperança de eternidade.
Seduz-me,
agarra-me, preenche os espaços intersticiais do meu corpo cansado com o mel dos
teus olhos e esse sussurro que cheira a plantas frescas, a terra revolta, mar
salgado, aves nocturnas, beleza feita tudo, sem fim, sem fim…
Cheguei
à hora final.
De
ti, e só de ti, dependerá o amanhã.
Fiat voluntas mea, sed
maxime fiat voluntas tua.
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