Alguém colocou recentemente no facebook um post sobre Camille Claudel.
Alguém a mencionou e…lembrei-me. Abateu-se sobre
mim outra vez o peso imenso, a dor sem limites, inerentes à passagem pela Terra
dessa mulher talentosa e bela, pela segunda metade do século XIX e a primeira
do XX.
Livre, selvagem, infinitamente aberta à vida,
Camille revelou desde muito cedo um talento extraordinário para a escultura.
Criou obras fabulosas, palpitantes de interioridade, reflectoras do feminino,
inovadoras na concepção e no movimento. Num mundo ainda intrínsecamente
patriarcal, Camille luzia com intensidade pouco comum – uma tocha no feminino que
urgia abater.
Discípula e amante de Rodin, levou à vida deste
o manancial das suas múltiplas ideias, o perfume e a natureza lírica de um
talento raro.
Apesar da tumultuosa paixão entre os dois, o
escultor nunca deixou a mulher e, após um aborto indesejado, Camille
recolheu-se só e chocada, apenas na companhia dos gatos e da sua obra. As
dificuldades conómicas, a má alimentação e o isolamento afectaram a sua
delicada sensibilidade e começou a sofrer surtos psicóticos. Nesse contexto,
destruiu dezenas de obras suas.
Apesar de ter tido o apoio do pai que morreu
cedo, a família de origem, preconceituosa e burguesa, jamais a entendeu,. Perante o percurso errático e pouco ortodoxo
e a instabilidade mental que se ia revelando, o irmão mais novo – o muito
admirado poeta e ensaísta Paul Claudel – e a mãe internaram-na num
hospício onde sobreviveu, em condições terríveis, por mais trinta anos. Apesar
do próprio hospital ter tentado várias vezes que a família reintegrasse Camille
por considerar desnecessário o seu internamento, a família nunca mais a quis de
volta e a escultora permaneceu encerrada até ao último suspiro.
Torna-se impossível imaginar o sofrimento atroz
desta mulher, completamente consciente do que lhe estava a acontecer como
demonstra a sua correspndência. Esmagada por um mundo masculino, brutalmente
castrador da força lillitiana do feminino, Camille pagou duramente o ser
diferente, livre e assumida e pereceu, após uma longa vida, aos rigores da existência
que a família lhe impôs.
De delirio em delirio, de crise em crise,
murchou a flor magoada, apagou-se o brilhante fogo daquela alma tão à frente do
seu tempo. Deixou enfim o seu tormento na cama do hospício, aos setenta e nove
anos, após trinta de clausura forçada.
Camille, mulher excepcional, a tua dor viaja no
tempo até mim, sinto-a nas minhas células.
Corre um canto estremecido por dentro das minhas lágrimas, pois eles estilhaçaram a tua grandeza e ficaram impunes.
Corre um canto estremecido por dentro das minhas lágrimas, pois eles estilhaçaram a tua grandeza e ficaram impunes.
À posteridade, passaram Rodin e o teu irmãozinho,
Paul Claudel.
Mas estamos sempre a tempo de reescrever a história .
Mas estamos sempre a tempo de reescrever a história .
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