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quinta-feira, 5 de julho de 2012

CONTRA-CORRENTE

A obra e pensamento de Robert Skidelsky, Emeritus Professor de Economia Política na Universidade de Warwick, em Inglaterra, reveste-se hoje em dia de uma feição de urgência perante a continuada (e aparentemente insolucionável) crise sistémica que o mundo ocidental atravessa. Acaba de publicar, juntamente com seu filho Edward, a obra “How much is Enough”, a qual, a partir das teses desenvolvidas por Keynes nos anos trinta do século passado, põe com pertinência questões relacionadas com a insustentabilidade do sistema económico-financeiro mundial e a necessidade urgente de rever o formato das nossas vidas, trabalho, lazer e necessidades pessoais, numa tentativa de recapturar a “boa essência da vida” que povos drogados pelo consumismo inevitavelmente perderam.
O problema de maior dimensão parece ter origem no caminho que as coisas levaram desde a Revolução Industrial, em que começaram as grandes poupanças e investimento em equipamento, fase à qual se seguiu a era do consumismo e que, segundo as previsões de Keynes, deveria ter desembocado num período em que o lazer ocuparia grande parte das nossas vidas e o tempo médio de trabalho semanal seria de 15 horas. Keynes esteve certíssimo, excepto em relação a este último ponto. Faltou-lhe levar em conta a insaciabilidade colectiva do ser humano em relação ao material, se o seu esforço de progresso neste ultimo não for acompanhado do correspondente desenvolvimento espiritual. A maturidade a este nível pôe na devida perspectiva o ter e o ser, e impõe limites naturais a essa sede desenfreada de mais e mais que o ser humano ocidental desenvolveu como propósito último da vida no planeta.
Assim, no mundo desenvolvido confrontamo-nos nos dias de hoje com a pessoa algo neurótica, frequentemente estimulada e controlada por químicos ou sessões de terapia pagas a peso de ouro, facilmente irritável e com tendência para se aborrecer depressa das sucessivas aquisições materiais. O problema da material é que, se não for criado e acompanhado ao nível da nossa consciência pelo seu significado simbólico e apreciado como tal no espaço e no tempo, uma vez passada a novidade o glamour esmorece e entra no reino do conhecido e do hábito. Substituir, deitar fora, consumir, consumir sem freios, apenas pelo efémero prazer de nos vermos confirmados no nosso poder aquisitivo – o qual se tornou sem dúvida e erradamente um dos maiores símbolos de poder pessoal – consumir mais do que o outro, ter mais coisas e mais caras adquiriram  o ilusório significado de avanço na vida e de superioridade sobre o próximo.
Afortunadamente, o sistema não é sustentável, pois a economia ocidental só pôde continuar a crescer (o que significou consumir) com base nos empréstimos que nos levaram à situação actual. Os grandes dividendos que se obtiveram com a revolução industrial, o avanço tecnológico e a expansão do sector financeiro foram na sua maior parte arrebanhados pelos muito ricos e o rendimento das populações em geral, após um eufórico periodo de crescimento, acabou por estagnar ou decrescer consideravelmente.
Vive-se hoje na grande sombra da incerteza. Sucedem-se os escândalos, parece que já nada é nem autêntico nem seguro. Creio assim que não resta ao ser humano senão o caminho do questionamento do que é que temos feito com as nossas vidas e a quem é que temos dado poder para as controlar.  Torna-se pertinente virarmo-nos de novo para a interioridade onde habita o poder pessoal de cada um e lançar um olhar renovado sobre ideias, princípios, valores. Chegou a hora da contra-corrente!

Nota:
Recomendo a leitura de
-   “How much is Enough? The Love of Money and the Case for the Good Life” de Robert e Edward Skidelsky
-   Artigo no FT de 05/07/12 “Enough is Enough of the West’s Age of Consumption"

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