Aos saudosos do antigamente, da forma e do passo a que as coisas se faziam,
aconselho, se não a tentativa de acompanhamento do processo, pelo menos o da
sua aceitação, como “fait accomplis” sem aparente retorno a épocas anteriores.
Os jovens, construtores do manhã, já nasceram
dentro destes novos valores e fontes de informação e parecem ter chegado
a este mundo apetrechados para lidar com
a complexidade de tecnologias
implementadas com crescente celeridade. Esta relação entre as tecnologias de
comunicação, informação e cultura, onde
a partilha dos valores do conhecimento acontece de forma muito mais
democrática, está a gerar um mundo novo com características muito diferentes
daquele em que muitos de nós receberam a sua formatação.
Há
como que uma inteligência colectiva a que estão ligadas as inteligências
individuais, que compartem e recebem informação
filtrada, adequada ao perfil e interesses do utilizador. Tudo isto se
passa no ciberespaço e a cibercultura
ocupa hoje um lugar proeminente no processo educacional, tem dado origem
a novos tipos de relacionamento social, incluindo o amoroso, e influenciado a
profunda transformação do mundo dos negócios com a implementação do sistema de
emails como a via de comunicação por excelência, aceleração dos contactos e o
“business” online. Todas estas
alterações acarretam alterações radicais no nosso modo de vida e criam, nesta
época de transição, grandes dificuldades de integração e de acompanhamento do
passo dos dias aos seres emigrantes de outro tempo, entre os quais me conto, em que se vivia,
crescia, aprendia e se ganhava a vida de modo diverso.
A
vinculação ao virtual tem vindo a transformar o ser humano em alguém mais
solitário e silencioso, que a pouco e pouco vai perdendo o hábito da
convivência presencial com as pessoas do seu núcleo e, com frequência, sofre de
adição à net, ao facebook, ao tablet e ao iPhone, instrumentos sem os quais sente
faltar-lhe o chão. A possibilidade de criar, sem custos, um espaço de expressão
imediata que, potencialmente, pode ser visto por muita gente é outro dos
grandes atractivos, pois permite a ilusão de um determinado protagonismo. Na
realidade, a pobreza das contribuições individuais é evidente, limitando-se, na
maioria dos casos aos famosos “like”. O contraditório praticamente não existe
e, se acontece, é muitas vezes gratuito, em desvio da temática que deveria
estar em debate, e corresponde a um falso diálogo entre surdos, mais preocupados
com ideias obsessivas.
Em
todas as mudanças tem de haver ajustes e, no assunto em análise, elas são
monumentais. Não é esse, porém, o aspecto mais preocupante. O que
realmente torna anti natural esta
viragem e adesão cega à tecnologia e ao relacionamento virtual é o que ela
representa de afastamento progressivo da pessoa do seu centro espiritual e
mental, a torna submissa e presa fácil da manipulação a que o conhecimento
superficial, a notícia distorcida ou
fora de data e o sensacionalismo dão lugar.
A meu ver e muito pelo que observo na internet, são maiormente as pessoas mais
educadas, com maior grau de cultura e espiritualidade que trazem contribuições
válidas a este vasto oceano de troca de informação. Pessoas que conservaram o
seu olho critico, sabem questionar o que lhes é apresentado e articular o
pensamento próprio. Pessoas, em geral, de uma faixa etária acima dos quarenta.
Esta
realidade aponta, tristemente, para o controle cada vez mais acentuado da
humanidade pela máquina. Aquilo que as religiões fizeram no passado, apesar de
tudo conservando no ser humano o sentido da ligação à transcendência, é agora
levado a cabo com maior eficiência e perversidade no ciberespaço.
Não
teria de ser assim. A tecnologia só tem razão de ser se nos servir, e se, pelo
apoio prestado aos nossos esforços de crescimento, contribuir para uma real
evolução da humanidade. Para que tal ocorra, urge rever os nossos padrões
comportamentais, hábitos, prioridades. Urge recolocar cada macaco no seu galho
e restabelecer a conexão ao sagrado da vida que habita o subtil e não o
virtual. Pois é do primeiro que devem sair
as linhas orientadoras do segundo.
Despertemos
e exerçamos vigilância, enquanto há quem o saiba fazer. Alternativamente,
resta-nos ter fé num deus "ex-machina"…
Sem comentários:
Enviar um comentário