Não consegui
resistir à tentação de escrever sobre o novo Presidente da
República. Ainda agora foi empossado e já fez correr muita
tinta. Vou, assim, repetir muitas coisas já ditas anteriormente.
Marcelo é
brilhante, inteligente, simpático, bem parecido, de uma informalidade elegante
e que nos cativa. Marcelo é trabalhador, estudioso, pragmático, culto e
bem falante, responsável, delicado, atencioso, cheio de afecto. A Marcelo não
são conhecidos desvios nem falhas de conduta no que se refere às finanças,
nunca esteve envolvido nos escândalos que hoje são, infelizmente, a ordem do
dia. O mais importante será, porém, o facto de Marcelo quebrar com o que
tem sido até agora a norma comportamental dos Presidentes da República Portuguesa.
Marcelo é, em
suma, excepcional e a sua ascensão ao importantíssimo cargo que passou a ocupar
apresenta-se até inesperada num país como o nosso, ainda tão emperrado por
afectações e preconceitos.
Após este primeiro
dia, o da investidura, o país está rendido ao personagem e, perigosamente,
espera-se dele o impossível: que salve a Pátria, a cultura, as tradições tão
castigadas pela globalização; que sare as feridas todas, que una as pessoas, os
partidos e que passemos a ser uma democracia exemplar. Que nos salve do odioso
AO90, reabrindo o debate, que ponha o país a trabalhar a sério e com gosto, mas
também a cantar, ao dar prioridade ao político sobre o económico. Que realize,
nem que seja só no nosso belo rectângulo à beira-mar plantado, o seu sonho
ecuménico de juntar todas as religiões – e começou no tom certo com o encontro
inter-religioso na Mesquita de Lisboa, ocasião em que representantes de
dezassete religiões rezaram em conjunto, algo inédito e sem precedentes.
Marcelo
é o “homem certo no lugar certo no momento certo”.
Pois, isso já eu sabia, razão porque votei nele. Mas ser a pessoa desejável para o mais alto cargo da Nação num dos momentos mais incertos da sua história, não faz dele um deus. Por mais diferenciado que Marcelo se nos apresente e maior seja a sua capacidade para, entre outras coisas, ajudar a restaurar a autoestima dos portugueses, tão abalada pela evolução histórica nas últimas décadas, ele continua a ser apenas uma pessoa muito empenhada na missão que se propôs e ao serviço da qual vai utilizar toda a sua capacidade e experiência política, mas com as problemáticas inerentes à sua condição de ser humano.
Prevejo que, a
falhar em algo, falhará pouco e raramente. Mas como sempre desconfiei da
adoração humana, adianto que esperar tanto dele é embarcar na
habitual projecção mítica que só pode conduzir à desilusão. A vida é muito
complexa, na nossa percepção abarcamos apenas a dimensão tangível e convém
manter a postura humilde de que há mais coisas entre o Céu e a Terra do que
aquilo que os nossos olhos vêm.Pois, isso já eu sabia, razão porque votei nele. Mas ser a pessoa desejável para o mais alto cargo da Nação num dos momentos mais incertos da sua história, não faz dele um deus. Por mais diferenciado que Marcelo se nos apresente e maior seja a sua capacidade para, entre outras coisas, ajudar a restaurar a autoestima dos portugueses, tão abalada pela evolução histórica nas últimas décadas, ele continua a ser apenas uma pessoa muito empenhada na missão que se propôs e ao serviço da qual vai utilizar toda a sua capacidade e experiência política, mas com as problemáticas inerentes à sua condição de ser humano.
O mundo está em
aceleradíssima mudança e, como disse o Poeta na hora derradeira, I know not
what tomorrow will bring.
Marcelo chegou e
que os céus abençoem a sua caminhada, nos próximos dez anos, pois não tenho
dúvida que será reeleito. Marcelo é solar e plurifacetado, abrangente e sedutor
e poderá reacender a luz da esperança na recuperação da nossa identidade. Mas
deixemos espaço à sua humanidade e não o sobrecarreguemos com o egregor das
nossas expectativas, naturalmente inflacionadas pelo desencanto em que temos
vivido.
Por último,
Marcelo diz (e diz bem) que a nossa é uma república e não uma monarquia e
que, por tal motivo, vai separar completamente a sua vida pessoal da
profissional.
Confesso que me
surpreendeu nele esta separação ultra-rígida. Se eu fosse filha, irmã,
neta ou companheira de Marcelo, teria querido estar e ser vista ao lado dele
naqueles gloriosos momentos da sua vida. Mais importante, se eu fosse Marcelo,
teria querido os meus entes queridos a meu lado, para que o mundo os visse
comigo, nessa ocasião e pudesse sentir o seu caloroso abraço na minha aura. Chocou-me ver os filhos e a nora atrás da barreira, em frente do palácio de
Belém, a tentar captar em filme o pai, que passava a guarda em revista. Há
coisas na vida, a meu ver, em que se não deve ir longe demais…
Marcelo tem perfil
de rei, muito mais do que o têm a maioria dos monarcas que ainda
sobrevivem no mundo. Por mais que o não queira, o povo irá sempre colher nele e
na sua vida referências comportamentais. E por muito activo que
seja, por poucas horas que durma, ao novo Presidente não vai restar
muito tempo para partilhar a vida com os seus. Será, aos olhos do povo, um
presidente afectuoso e gostável, mas só.
Se é essa a sua escolha
consciente, tudo bem. Mas lembre-se, Senhor Presidente, que a água não corre
duas vezes igual debaixo da ponte, que as crianças crescem, os afectos precisam
de ser regados e que é na partilha com os amados que a vida exsuda o seu
perfume maior. Não vem nenhum mal ao mundo que este o possa testemunhar.
Bem haja!
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