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domingo, 14 de julho de 2019

LAZER - Outra forma de trabalho


Ando a descansar, à força. Tento aproveitar o que me resta do fim de semana para me entregar a  mim mesma e a uma palavra meia alheia àquilo que a vida me tem permitido: lazer.
A palavra legitima o merecido descanso que pode corresponder a actividades prazenteiras para o ser, no meu caso ler, escrever, remexer os livros, papéis, objectos de culto, estudar as mil e uma coisas que não sei. Ou o jardim que amo e que visito e amparo com a regularidade possível. Como a minha saúde começou a acusar a carga excessiva de trabalho e, sobretudo, o efeito corrosivo de transtornos emocionais, faço um esforço no sentido deste “ócio”, leia-se, apartamento da actividade directamente ligada ao dever e o ganho material para a sobrevivência.
Dormito a espaços regulares, frente ao écran, livro ou simplesmente recostada numa tentativa de meditação – apago zonas de pensamentos sombrios, enraizo-me, faço-me rodear apenas do alívio que as flores me trazem...

Quantas noites escuras da alma ocorrem em cada vida? Já vou na terceira ou quarta, sendo a actual a mais dura de todas. Uma amiga estudante de astrologia disse-me há dias que este período da minha vida, fortemente regido por Saturno e que já dura há anos, corresponde ao maior desafio por que passo nesta vida, mas que o meu mapa indica que a crise terminará no final deste ano. E que a partir de 2020, tudo se iluminará no meu caminho para a transcendência, algo a que a minha alma aspira com todas as forças. Que vou escrever muito mais, que posso até ganhar dinheiro com isso (difícil de acreditar, num país como Portugal e dado o estado colectivo das coisas e das pessoas...)

Enfim, é preciso acreditar nalguma coisa. Só me tenho a mim própria (que vou descobrindo o que sou), este ser mutante em busca da alma encantatória de dias de paz e de coerência.
Por ora, tenho o resto de um domingo vivido dentro de portas – está um braseiro lá fora -, o meu doente adormecido até pelo menos final da tarde, o silêncio da casa grande, que continua à venda, esvaziada da famíia que criei portanto vazia de afectos, as saudades das minhas crianças que já me parecem pertencer a outra encarnação.
Sinto os olhos mortos ante tanta e bela arte que muito significou para mim no passado. Tudo tão estranho, desconhecido...
Mais tarde, vou ter de preparar o dia de trabalho de amanhã, que disso não me livro. Cozinhar algo para o meu doente, auscultar o que diz o ar ao cair da noite alentejana e inventar outra crença qualquer para me ir aguentando.
Ah, carpe diem...descanso, lazer, reinvenção/redescoberta do propósito da vida.

Quem sabe...
...se ninguém sabe nada?

Quadro: Tarsila do Amaral, "Figura Só"

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